Não atenda o celular

sexta-feira, 22 de julho de 2011
Lembrei, na hora, daquela frase que ecoou pelo salão vermelho do IESA,  na reunião de estágio dos primeiros formandos de Biomedicina: "- Nunca, em hipótese alguma, usem os seus respectivos celulares dentro do laboratório. Lidamos com vidas e não podemos nos abrir a distrações."

Mas ninguém ligou muito para o aviso, pois desde o Ensino Médio, todos aqueles integrantes da geração Y já ouviam essa frase. 
No outro dia, com a barriga borbulhando, todos iniciamos o estágio curricular em Análises Clinicas.
Eramos divididos em grupos, e em setores de análises. A cada 15 dias ocorria a rotação, os grupos se ambientavam no seu novo setor e tocavam em frente aquele harmonioso laboratório-escola.

Mas eu confessarei. 
Estava tenso na véspera de uma troca de setores: Sairia da parte da coleta, onde lidávamos diretamente com as pessoas para ir ao setor que sempre gerou frenesi em quem me perguntava o que era a Biomedicina: 
- Urgh! Então quer dizer que você é quem analisa as fezes que levamos naqueles potinhos brancos?  
-Sim. Respondia, quase que me arrependendo da profissão que havia escolhido.

Mal dormi naquela noite com medo de ter pesadelos.
Seria a primeira vez que eu ficaria trancado em uma sala durante quatro horas seguidas trabalhando apenas com aquele tipo de amostra.
Mas sabia que era parte do meu trabalho, então, decidido a acreditar que me acostumaria, eu fui.

Os dias foram passando e, de fato, eu estava conseguindo lidar bem com aquilo.
Lembro que estava na bancada, preparando uma análise, quando meu bolso vibrou: Era o celular.
Disfarcei, dei uma olhada para os lados e só vi meu microscópio, o famoso potinho branco abarrotado, um copo cônico cheio até a boca de amostra diluída, laminas de vidro e, o vazio.
A professora não estava, e os colegas aproveitaram para se escafeder dali. Mas eu concentrado nem tinha percebido. Só notei que estava sozinho quando meu celular tocou.

Como não tinha ninguém ali, pensei que atender o celular seria, de longe, o menor dos crimes, visto que os outros sumiram todos. Tirei as luvas, peguei o celular e abri.
Não conhecia o numero, mas atendi:
- Alô!
Uma voz feminina sussurrante que gritava volúpia disse:
- Eu quero você, todinho. Agora!!!!
Arrepiei dos pés a cabeça. Não consegui pensar em nada a não ser:
- Hã?
A voz (que se transformou em uma loira de olhos verdes com 1,70m na minha cabeça) repetiu:
- É isso mesmo! Eu quero você. JÁ!!!!!!!
- Adivinha o que que eu estou vestindo agora! Provocou ela.

- Nada? Respondi obviamente, não sabendo bem o que dizer e tentando ganhar um tempo pra pensar no que fazer.

- Isso mesmo. Nada, nadinha, nadica de nada. E está tão frio, preciso de alguém pra me esquentar. Sai da sua casa e vem pra cá, agora! Gostoso!

- Mas eu...Mas eu não...

- Vem, AGORA.

A voz loira de olhos verdes com 1,70m de pura volúpia tinha dado o ultimato: Ela não estava para brincadeiras. Uma mulher que fala o que ela falou nunca está para brincadeiras. 
Essa era a minha chance. Era ir e desfrutar, ou titubear e.....e....e nada. Não havia segunda opção. Eu não ficaria nesse laboratório nem que me pagassem.  Eu ia! Ahhh se eu ia. 

- Estou saindo do laboratório agora. Me espera ai, do jeito que está. Disse isso e saltei com a cadeira para trás. Tão rápido que nem senti minha coxa bater na bancada.

- Laboratório? Como assim? Não é o Diego?
- Não. É o Bernardo! - Disse, grilando os olhos.

- Tuh, Tuh,Tuh,Tuh,Tuh,Tuh,Tuh! Eu ouvi isso, enquanto assistia aquele copo cônico dançando desengonçadamente por sobre a bancada, a 40cm de mim.

Quando tentei levar a mão desnuda, já era tarde.

- Tecccc!

Não havia outra palavra à pensar.
Não havia mais liquido nenhum dentro do copo.

E não houve, no IESA inteiro, quem não ouviu o meu suplício:

- MEEEEEEEEEEEEERDAAAAAAAAAAAA! 


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