Toninho, o Príncipe do Brasil.

terça-feira, 26 de abril de 2011
O príncipe brasileiro estava muito preocupado.

A família real estava pressionando-o há anos: ele deveria casar.
Precisava encontrar a nova princesa do Brasil. Uma mulher que enchesse o país de cor e beleza, alguém que colocasse a família real brasileira de volta às manchetes. Uma mulher que pudesse ser admirada, e quem sabe até ser chamada para uma entrevista no Jô Soares.
E ele sabia que o momento era esse, visto que não se falava em outra coisa a não ser o casamento do príncipe Galês, William.

O chefe da casa imperial brasileira chamou-o e disse:
- Toninho, tu deves encontrar uma Kate Middleton para ti. Nós precisamos disso, temos que pegar carona nessa onda real que se espalha pelo mundo. Dou-lhe total apoio, ela pode ser até uma plebéia, isso mostra igualdade, é ótimo.

Antônio Lara de Orleáns e Bragança saiu atordoado de casa. Sim, ele ainda morava com o Rei e a Rainha do Brasil, no Leblon. O país já nem dava bolas para eles, teve todo aquele lance de ditadura, depois veio o presidencialismo com um operário comandando o país, depois uma mulher, e eles foram gradativamente sendo suplantados. Seu pai odiava isso, mas Toninho nem ligava, adorava o anonimato. Podia sair e beber todas pois sabia que no outro dia só ganharia uma ressaca, nada de notas em jornal.

Sentou-se no boteco da esquina e ficou pensando na proposta do pai. Ele estava com 28 anos e achava que era mesmo a hora de casar-se e sair de casa. Tivera muitas namoradas, mas nenhuma que o encantasse tanto a ponto de propor-lhe um casório. A não ser a Gabriela, mas ele nem gostava de lembrar.

Ah, a Gabriela era linda: Cabelos morenos de um preto breu, pele branca de traços fortes com olhos verdes protegidos por longos cílios em leque que pareciam te abanar a cada piscadela. Peitos médios e rijos e uma bunda de dar inveja a madrinhas de escola de samba.
O príncipe a conheceu na faculdade. Fazia Educação Física, ela, Direito.

Namoraram por três anos. O Rei e Rainha a adoravam, pois era uma garota muito espirituosa. Todos os domingos, enquanto o Rei assava uma picanha só de bermudas no pátio da casa ela gritava:
- Sogrinha, pode deixar que a maionese eu mesma faço.
E no fim das refeições, como uma bela súdita, sempre se prontificava a lavar a louça.

Todos acharam que dali sairia um casamento. Até o príncipe.
Mas quando o romance se encaminhava para o matrimônio houve um rompimento.

Ela, em meio a uma crise de histeria proveniente de sua TPM implicou com o Toninho porque ele tinha ido ao jogo do Vasco bem no dia do aniversário de namoro.

Ele tentou argumentar, dizendo que era um jogo muito importante, pois o Vasco lutava contra o rebaixamento, mas não teve jeito. Ela mandou-o pastar e temperar com sua imaturidade.

Ficaram duas semanas separados, e Toninho em total desespero. Ligava todos os dias mas ela o ignorava sempre. Até que um belo dia, eis que bate em sua porta Gabriela, aos prantos. Com mil pedidos de desculpas e duas mil juras de amor eterno.
Eles reataram, mas o romance não durou muito mais tempo. Dizem que o príncipe descobriu o que Gabriela fez nas duas semanas em que ficaram separados.

Não se sabe ao certo de que maneira ela viveu estes catorze dias, mas foi suficiente para destruir tudo o que ele nutria por ela.

Ele levantou da cadeira e foi até o balcão do boteco:
- Diz ai Batista, mulher é tudo igual, aqui e na Inglaterra, né?
- Mas com certeza Toninho, por quê? Responde o Batista, limpando a testa com o pano pendurado em seu ombro.
- Porque eu tô com pena desse príncipe William ai, que vai casar sexta, agora. Ele ficou separado da noiva por três meses, sabia?
- Não sabia não Toninho, mas o que que tem de mais nisso?
- Ah, Batista. Três meses é muito tempo pra uma mulher solteira. É muito tempo mesmo.

O príncipe brasileiro deu de ombros e se foi, com os olhos marejados:
- Plebéias. Ah, plebéias.

O bis branco

terça-feira, 19 de abril de 2011
Gérson entrou no mercado em pleno estado de desespero.
Trabalhou em dois turnos nos últimos 5 dias e acabou esquecendo do pedido da amada:
- Xuxu, não precisa gastar nada comigo na páscoa, tá? Eu só quero uma caixa de bis branco. Branco, viu Gérson? Eu sou uma mulher diferente da maioria, nem gosto tanto assim de chocolate.


Aquilo tinha acontecido no domingo passado, ele tinha a semana toda pra comprar, mas o idiota do Cícero tinha que chamar justo ele pro plantão. Porque não chamou o Alcídes que não tem família, e nem namorada? Foi o Cícero que o colocou nessa situação, maldito.
Cícero era o seu chefe imediato lá no hospital. Gabava-se por ser o enfermeiro-chefe mais novo da história do Hospital Protássio Engers. Mas ele era um completo idiota. Todos sabiam que ele só estava lá por causa de sua noiva, que veja só, era neta do homem que emprestava seu nome ao hospital.

Nessas situações Gérson via como o mundo era injusto. Ele foi colega do Cícero na faculdade, e sempre foi melhor que ele. Nunca errou o nome de um osso nas aulas de Anatomia, nem o nó em uma aula de sutura. Sabia de cor a características de todas as células do sangue e até mesmo discordava dos diagnósticos que ele ouvia no seriado do Dr. House.

Ele exclamava na sala da enfermagem: - Como isso, House? Uma leucemia sem tu pedir um Hemograma? Tá errado isso, ta muito errado.

E depois de passado todos aqueles anos de dedicação e martírio, é chefiado por um cara que sabia muito menos que ele, e que só por birra o escalou em semana de páscoa.

Mas sábado ele conseguiu sair mais cedo e correu pro super mais próximo.
Chegou em estado de vigília total, as pupilas dilatadas e todos os sentidos em prontidão.
Ele sabia que quem estava no super a essa hora tinha esquecido de algo, e estavam todos algozes pois sabiam que os melhores chocolates já haviam terminado.

Passa como um raio pelo corredor de banho e pega a esquerda na encruzilhada.
Cruza com maioneses e massas em promoção, nem olha o preço da cerveja, e ruma ao norte.
A distância de dois guichês avista a padaria e se frustra. Já está chegando ao fim do mercado e nada ainda, ele não podia dar-se ao luxo de perder tempo sabendo que talvez houvesse poucas caixas de bis brancos a serem arrebatadas.

Ultrapassa os freezers vazios, que provavelmente conservavam os peixes de todos os almoços de ontem e, bingo, surge diante de si uma grade com ovos de chocolate pendurados.

Gérson corre até lá, e a 30 passos de distancia enxerga o seu alvo. A caixa de bis branco. Uma só, mas não importa, seria a sua.

Graças a deus, a salvação. Sorri satisfeito.

Mas não, droga. Uma mulher está indo em direção a ela, com a mesma avidez.
Uma caixa, duas pessoas.

Ela enxerga Gérson e apura o passo. Uma olhada para a caixa, uma para o enfermeiro. Uma para a caixa, uma para o enfermeiro.
Ele faz a mesma coisa. Chegam juntos:
- É minha. Diz a linda mulher enquanto entrelaça os longos dedos na caixa retangular
- Moça, por favor. Minha namorada pediu apenas uma caixa de bis brancos na páscoa, eu trabalhei a semana toda e a única chance que eu tive para comprar o presente foi agora. Seja altruísta, por favor!
A mulher sorri e diz:
- Pois então trate de ir pensando numa boa desculpa para dar a ela. E dá de ombros.
Gérson entendeu tudo.
Que mulher abdicaria de seu desejo chocólatra apenas para fazer o bem ao outro?
Não existe ética feminina quando o assunto é chocolate.

Ele suspira, transparecendo o medo de ir para casa.
- Tomara que ela seja mesmo diferente.

Aquele verde que só Nery viu.

segunda-feira, 18 de abril de 2011
Ele calçou os óculos na expectativa de que o resultado fosse nada diferente do que o médico falou:
- Você verá o mundo melhor. E deu um sorriso canalha, tipo como o dos atores quando dizem um clichê.

Saiu do consultório estremecido. Ou o médico estava certo, ou o mundo mudou por si só naqueles 5 minutos.
Notou que a secretária já não era tão bonita, e o sorriso ao dizer oi também não era do mesmo branco.

Mas o estranho não foi isso.

Um segundo observador que estava posto do outro lado da rua, sentado no muro do Hospital viu o Nery descendo as escadas do Centro Clínico e riu.
Até ouvi o que disse para um outro: - Olha lá, ele tá andando estranho, parecem passos de elefante.

Nery tinha perdido a noção do espaço. Seu cérebro não havia se acostumado com aquelas lentes.
E eu vi na cara dele o mesmo desgosto que os outros que saem de lá também sentem enquanto dão passos altos, parecendo mesmo um elefante.

O mundo era mais legal antes. Havia algo de poético em não ver com perfeição: Ele poderia completar por si só os espaços deixados por aqueles 7 graus de miopia.

Nery vivia em uma espécie de mundo paralelo, no qual havia um pouco de si em tudo.

E talvez o médico tenha mesmo se enganado, o mundo, de maneira nenhuma estava melhor assim, essa já nem era a cidade na qual nascera.

Enquanto ele subia a rua, dava-se conta que aquela era a primeira vez em que via a escola que estudou. Pensou se as garotas que ele considerava as mais belas da escola eram realmente belas. E se as feias eram fugazmente feias.

E assim foi passando os dias. A cada descoberta, uma pesagem. Ele deveria por de um lado a imagem que ele tinha armazenado com seus sete graus de contribuição e do outro a que realmente existia.

Era uma tarefa árdua, mas estava se adaptando bem, até que chegou o dia D.

Nery encontrou na rua a garota que sempre lhe povoou os sonhos. Loira de cabelos cacheados, 1,70 m de pele branca e pura volúpia. E ela era incrivelmente linda, quase como sempre a imaginou, a não ser por um detalhe. Os olhos.

As lentes, sustentadas por hastes de metal presas atrás de suas orelhas apresentavam-lhe um verde esmeralda belo, mas normal, quando comparado ao de suas lembranças. Isso não tirava a beleza de Maria, de forma alguma. Mas ele era encantado por outro verde.

Por aquele verde que não existia.

Por aquele verde que só Nery viu.









Clarissa, a secretária.

sexta-feira, 15 de abril de 2011
De 2 dias é feita a minha ansiedade.

Até sexta tudo estava normal, despertador, café, trabalho, casa. Sempre nessa ordem: Vilão, prazer, obrigação, e satisfação.

Vilão porque me buscava de um mundo doce e me atirava de volta à realidade, em que embaixo de dois cobertores ao pleno rigor do inverno, eu ainda sonolento precisava iniciar uma contagem regressiva para a primeira batalha do dia: pular da cama, atravessar o quarto escuro apenas de bermudas e camiseta e em um único golpe desligar o ventilador.

Se eu me equivocasse em algum desses passos eu sentia que congelaria e ali mesmo seria feito de mim uma estátua daquelas, de gelo, como as de Nova York. Imagina a minha vergonha se o pessoal visse a camiseta que eu dormia. Ainda bem que eu nunca errei o botão do ventilador. Ainda bem.

O café creio que não seja tão necessário detalhar: Calor, ânimo, assunto. A revigorada pós choque de realidade e temperatura que todos conhecem.

Só que sexta-feira algo aconteceu e alterou os adjetivos do resto da rotina: Com um sobretudo e botas, ambos pretos, calça jeans de um azul envelhecido, com o pescoço envolto por um cachecol vermelho xadrez  que combinava com o rosa de suas bochechas adentrou no ambiente uma mulher de sorriso impecável, voz doce e educação real.

Aquele escritório de advocacia virou um zun-zun-zun. Todos preocupados em saber quem era aquela moça.

- É cliente?
- Será que é divórcio?
- Tomara que seja divórcio.

Todos os olhares eram dela, e foi uma surpresa geral quando ela entrou direto na sala do Pacheco sem perguntar nada à ninguém.
Foram 20 minutos de tensão naqueles 95m² de escritório quando abrem-se as portas marrons com acabamento negro e de lá vem Pacheco sorrindo com um ar orgulhoso:
- Pessoal, essa é Clarissa, minha nova secretária, segunda ela começa.

Silencio no recinto.

Enquanto os homens sorriam absorvendo a idéia de que a veriam todos os dias, as demais secretárias inclusive Lourdes, a minha, lançavam em Clarissa um olhar metralhante. Eu cheguei a ouvir o pensamento em coro delas:
- Ridícula.

Clarissa saiu e a boataria começou:
- Será que o Pacheco tem um caso com essazinha aí? Porque ele dispensou a Bianca, que trabalhava um tempo para ele a menos de duas semanas, só pode que foi pra ficar mais perto dessa aí, né Jeruza? Dizia a Lourdes.

Já o Vinícius gritava lá no cantinho do café:
-Grande Pachecão, a única coisa boa que ele fez em prol desse escritório nos últimos anos foi essa. Porque as causas, tem perdido todas. E ria.

Resumindo, esse foi o assunto de sexta.
Entende porque meu final de semana foi feito de ansiedade?
Amanhã a Clarissa começa. Tomara que eu não erre o botão do ventilador.

Retratos do fim de semana

terça-feira, 12 de abril de 2011
- Oi Charles.

Eu olhei para os lados, não sabia de onde vinha aquilo e nem se tinha outro Charles indo ou voltando do banheiro do Pub.
Será que foi comigo?

Não podia ser. A Ana, Aninha, a mais bonita dos tempos de escola dando oi pra mim? Um cara sem dinheiro que nem dava cola pra ela. Tinha alguma coisa errada ali.


No ultimo ano de ensino médio a gurizada inventou um apelido pra Aninha: Anosa.
Diziam: - Eiiita, Anosa. Cada dia mais gostosa.

Ela ria, se orgulhava. Desfilava toda pomposa com aquela bundinha empinada quando saia do refeitório com aquela maçã mordida na mão.


Sempre invejei o cara que inventou esse apelido, porque a gente via no olho dela que ela adorava. Tanto é que no item - Apelido - do questionário da Marta morta ela tascou um ANOSA com letras garrafais, tipo eu quando escrevi no item - Time- um baita de um GRÊMIO.

Mas ela não fugia da raça típica das populares da escola, esnobava quase todo mundo. Só tinha olhos para o Vagner, o fixo do time de futsal do colégio.

O guri era bom de bola, a professora até dizia:
- Vaguinho, vai tentar uma peneira lá pra cima, eu acho que tu passa. Mas tem que largar essa marra ai.

Mas o Vagner não tinha visão, achava que a vida dele era confortável, jogava a sua bolinha, ria dos gordinhos da escola, e o principal - ficava com Aninha.

Eu sempre achei que ele só não estourou no futebol por causa dela.


Eu voltei a olhar para aqueles olhos verdes gigantes que traziam consigo a Aninha Anosa na minha direção e decidi fugir. Nada me tirava da cabeça que algo muito estranho acontecia ali.

Hoje eu contei essa historia para os amigos e todos riram, falaram:
- Também Charles, tu não viu o tamanho que está a Ana?
Eles até inventaram outro apelido para ela: Anona Bolona.
Essa gurizada não muda mesmo.

Vou jogar teu número no bicho.

segunda-feira, 4 de abril de 2011
- O que era pra ti? Indaga a moçoila de riso fácil que trabalha na lotérica.
- Quero fazer um jogo. Responde João Pedro.
- Quina, Dupla-Sena, Mega-Sena, Lotomania, Lotofácil, Federal? Qual vai ser.
- Na verdade eu te vi e pensei em jogar o teu número no bicho. Se ganhar te dou a metade. Topas?

De repente a moça esconde os dentes. Ela não sabe o que dizer.

Olha para os lados, a sua colega está ocupada atendendo uma idosa que tenta lembrar a senha do cartão.

Ela já tinha vivido algumas situações como essa e tinha se saído bem, tinha uma técnica para despistar esses abordadores.
Só que em nenhuma dessas vezes havia dinheiro no meio.

Ela pensou: - Se ele pega no milhar dá mais de mil pra um. E se ele não ganhar nada é só eu não atender. Mas ele não vai jogar, óbvio que não. É tudo papinho.

Ela olha por cima do ombro do Jotapê pra ver se não havia nenhum amigo dele observando. Muitos vem falar com ela só pra se exibir, às vezes eles nem ligam. Bem, na verdade ela não sabe se eles ligam ou não.

Ela sorriu, já sabia o que fazer.


Jotapê nunca tinha visto alguém destampar uma caneta bic de forma tão sexy.
- Foi com a boca cara, com a boca. Dizia ele para o bicheiro enquanto o senhor com brincos dourados anotava aqueles números.
- Para as 14h ou 18h? Pergunta o contraventor
- Joga em todas, vou ganhar. Tenho que ganhar. A sorte tá do meu lado cara, eu sei.

E não é que deu o número da Ângela na cabeça? Ela se desesperou.
- Droga, droga, droga. Fiquei sem dinheiro e sozinha sábado à noite. Porque que eu fui dar a senha daquela velha pra ele jogar?
- Droga, droga, droga.


João Pedro nunca mais apareceu. E a moçoila da lotérica nunca mais mentiu o telefone.






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