E se perguntava, todo santo dia, que culpa tinha por não agradar a todos.
Antes de dormir, Rosana fugia. Fechava os olhos, mas as suas pálpebras não conseguiam diminuir a intensidade da luz que importunava. Se abertos, a luz que incomodava era a que se derramava pelo vão da porta;
se fechados, vinha doutro lugar.
No silencio do seu quarto vazio, uma mulher de 23 quase podia ouvir o som de um pensamento. No estado de semi-sono, ela conseguia desconstruir toda a brevidade de uma lembrança em cores, música, e odores.
Com os olhos cada vez mais cerrados, o turbilhão de reações elétricas provenientes de seu cérebro iluminavam, quase que realmente, os seus olhos. Via explodirem cores e luzes à questão de milímetros de si. Tão rápido quanto a luz, que mais parecia um retrato daqueles furacões com nome de gente que aparecem lá pro norte, surgiam rostos. E cada boca balbuciava uma palavra, enquanto o resto da face era substituída por outra, e outra, e outra.
Às vezes as frases expulsadas do seu sub-consciente tinham sentido, que logo eram transformados em uma imagem, como na vez em que viu uma pintura à tinta óleo de várias arestas arredondadas subindo uma terra úmida, enquanto dois centímetros de chão escondiam as pontas perigosas de alguma coisa.
Ela já chegou a postular que o que via era o processo normal de transformação de memórias de curto para de longo prazo.
Mas ela sempre está cansada demais para decidir acordar e anotar os pensamentos que surgem desse breve estado. Quem dirá para tentar pintar quadros das imagens que vê nascerem em frente aos olhos.
E acreditem: ela tem vontade.
Mas ela também tem vontade de tanta coisa.
De viajar. De conseguir um emprego que lhe dê segurança, ao mesmo tempo em que lhe proporcione os medos inerentes de responsabilidade e crescimento profissional.
Rosana tem vontade de ser atriz na frente de qualquer espelho. Emprestar a sua face a alguém que não tenha tantos problemas como ela, mas que também não ache as soluções para esses poucos problemas rápido demais.
Ela quer sentir o frio na barriga, mas não gostaria de arcar com o ônus do fracasso.
E antes das luzes cessarem, esse pensamento faz pintar outra imagem em seus olhos: a Monalisa.
As bocas incessantes disparam que talvez não seja boato.
Talvez seja realmente Leonardo, com uma tela e um espelho em sua frente.
Tudo isso, mas nada mais.
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